sábado, 23 de abril de 2011

Liberdade e Desespero

Leia ouvindo Gravity


Era uma vez um garoto.
Um garoto comum como outro qualquer. Um garoto que crescia se perguntando se ele realmente seria alguém quando crescesse e se tornasse adulto. Ao seu redor muitas pessoas, muitas pessoas altas e que ele não conseguia enxergar o rosto. Era o que mais preocupava esse menino. Como ele poderia confiar nessas pessoas se não enxergava os rostos delas?

A cada dia que se passava ele percebia que conseguia sorrir. Mostrar os dentes. Morder. Arrancar pedaços das coisas com os dentes. Destruir coisas ao seu redor. Ele percebia que seu coração batia descompassado. As músicas que vinham de cima fazia o ritmo do seu coração variar. Algumas vozes soavam tão bem desenhadas. Tão bem moldadas aos seus pequenos ouvidos. Esses ouvidos que ele sentia arrepios quando tocava com as mãos. Mãos macias que ele sentia sangrar quando tocava o chão. 
O chão que ele tocava não era de todo ruim, mas algo podia melhorar. Aquele lugar era só dele. Um lugar que só ele podia encontrar. A chave daquela exatidão morava no coração dele. Ele tinha vontades. As coisas chegavam perto dele e ele queria agarrar, queria conhecer, jogar pro alto e ver o que acontecia.
Um dia ele ouviu um grito. 
E a cada dia que passava esses gritos aumentam. Pareciam se aproximar. Como um garoto tão pequeno poderia impedir que aqueles gritos se apoderassem dele!? O medo foi crescendo em seu coração. Um medo que dominava cada célula dele, que vinha desde baixo rasgando e roubando tudo que tinha de bom nele. O garoto não tinha mais cor e os gritos entravam pelos seus ouvidos ecoando dentro da sua cabeça fazendo ela girar em sentidos que ele não tinha controle.
Ele criou um muro a sua volta. Não um muro comum, mas um muro intrasponivel. Cinco pequenas janelas faziam o contato com o mundo exterior. Através dessas janelas ele sorria. Um sorriso lindo, tão verdadeiro, tão infantil, daquela infantilidade que não existem mentiras. Os gritos continuavam lá fora. Mas mesmo assim ele sorria.
Era desesperador sentir que ele não podia fazer nada. Então uma idéia veio-lhe a cabeça. Correr. Ele tentou se levantar, mas percebeu que estava grudado ao chão. As pessoas que viviam ao seu redor não eram altas, ele é que estava jogado no chão. E os gritos viraram olhos que tentavam entrar pelas janelas. E as janelas foram quebradas por mãos que tentavam agarrá-lo. E então ele gritou. Gritou, gritou e gritou. E de si saiam pedaços de si mesmo. Pedaços queimados que não eram dele. E as mãos pararam de se mexer. Os gritos cessaram. As pessoas sumiram. 
Já não era sem tempo a solidão chegou para lhe fazer companhia. Aquela moça alta, esguia com cabelos compridos sentou-se do seu lado. O garoto foi virando homem. Já não tinha curiosidades. Já não queria ser ninguém. Tudo que ele devia lutar contra vivia dentro dele. As mãos estavam em suas mãos. Os gritos presos em sua garganta. Ele estava em pé. Solidão continuava sentada. Ele tentou agarrá-la e jogá-la longe. Ela de relance olhou-o, fitou-o no mais intimo do seu ser. Roubou pra si seu coração.


Hoje ele vive. Vive em mim. Vive em qualquer um que não sabe o que fazer. Que não sabe o que ser.

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